A crescente insatisfação com as modernas concepções acerca da mente tem deslocado a atenção dos neurocientistas nos últimos anos para altruísmo, empatia e intersubjetividade, temas antes restritos ao território de filósofos e psicólogos. Assim teve início uma intensa exploração de seus correlatos biológicos para esclarecer não apenas a complexidade e os tipos de vínculos que as pessoas formam entre si, mas também − e sobretudo − para compreender a estrutura e a evolução da mente individual.Para as ciências cognitivas clássicas, o funcionamento da mente é semelhante ao do computador − isto é, pensar equivale a calcular. Em certo sentido, a mente seria uma entidade isolada que independe da relação com os outros. Ao concentrar todo esforço para esclarecer as regras formais do funcionamento da mente − deixando de lado o contexto no qual ela se desenvolve −, os cientistas dessa vertente demonstraram pouco interesse em desvendar o senso de identidade − vivenciado por todos nós quando entramos em contato com nossos semelhantes.
Inúmeras evidências científicas demonstram que o homem é um animal social que precisa da relação com seus pares para crescer e sobreviver. Mas permanece aberta a seguinte questão: a sociabilidade é inerente à mente humana ou resulta do contexto social, aparecendo num segundo momento e de forma complementar? Se considerarmos verdadeira a primeira hipótese, que importância devemos atribuir aos aspectos fenomenológicos e experienciais das relações interpessoais? Nosso ambiente social é habitado por outros indivíduos que, como nós, mantêm relações intencionais com o mundo. Estamos, portanto, numa relação de sintonia intencional natural com os outros. No entanto, essa sintonia não diz respeito apenas à esfera das decisões e das escolhas, mas também − e talvez mais significativamente − das emoções e das sensações alheias. Somos ligados aos outros por com partilhar o sentido de suas ações, emoções ou sensações, por termos em comum os mecanismos neurais que as produzem. A sintonia intencional faz com que o outro diante de nós seja muito mais que um sistema de representação − ele é uma pessoa como nós. A subjetividade humana, e provavelmente também a de animais distintos do Homo sapiens, surge no momento em que o homem descobre a si próprio. A conseqüência lógica e psicológica mais relevante dessa descoberta é que a subjetividade animal, e especialmente a humana, é na realidade uma intersubjetividade original: uma aquisição que vai na direção oposta à tendência individualista que prevalece na psicologia contemporânea, particularmente nas ciências cognitivas.Pesquisas recentes da psicologia do desenvolvimento vêm subvertendo nosso conhecimento no que se refere às capacidades cognitivas de recém nascidos e crianças. Elas mostram que desde o início da vida somos capazes de comportamentos antes associados a habilidades cognitivas mais complexas, presentes apenas nos adultos. Um aspecto surpreendente em bebês é a capacidade de integrar informações sensoriais de vários tipos. Isso ocorre quando reconhecem como visualmente distinto o que havia sido percebido como diferente apenas com o tato, por exemplo. Outros estudos mostram que os recém-nascidos podem determinar com muita precisão a intensidade e a seqüência temporal de uma estimulação sensorial independentemente de sua modalidade (auditiva, tátil, visual etc.). Integrar informações parece ser uma capacidade inata ou de desenvolvimento muito precoce. Como é utilizada na construção dos laços sociais, ela desempenha papel central na evolução da inteligência social. Outra habilidade de grande interesse nos bebês é a imitação por meio de movimentos de rosto, especialmente com a boca, isto é, partes do corpo que não vêem. Baseado no comportamento observado, a informação é transmitida às áreas motoras para a reprodução daquele determinado comportamento. Provavelmente inata, a capacidade imitativa já pode ser observada nos primeiros dias de vida e permite ao bebê criar relações de afeto com seus semelhantes. Essas dinâmicas precoces mostram que os vínculos interpessoais já estão ativos no começo da vida, quando ainda não dispomos de representações subjetivas do mundo, pois a consciência da própria identidade ainda está longe de se constituir.
Exemplos como esses indicam que nosso sistema cognitivo é capaz de compor um mapa complexo, abstrato, que utiliza fontes sensoriais variadas muito antes do desenvolvimento da linguagem e de outras formas sofisticadas de comunicação e interação social. O desenvolvimento de uma forma progressivamente mais madura de comportamento imitativo − que implica consciência do significado daquilo que é imitado − vem sendo o centro de um controvertido debate na psicologia entre os que consideram a capacidade de imitar como atributo exclusivamente humano e aqueles que a conferem a outras espécies.

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